Jardim

Ri-me quando se corrigiu e olhei-a. Pronto, não era feia, nunca a tinha achado feia, mas não me dava com ela, nem pretendia. - Desculpa enganei-me. Zangada - passei as mãos pelo seu cabelo com um suspiro e despenteei-o - nem com saltos, Zangada? - sorri com o seu sorriso e encolhi os ombros com o que ela disse, eu não tinha pais, ela é que não sabia - Não, eu só gosto de dar nomes às coisas.

Afastei-me dele quando me mexeu no cabelo e pousei as mãos no peito dele, empurrando-o para trás - Deixa-me em paz, parvalhão. - revirei os olhos e abanei a cabeça. Descalcei os sapatos e peguei neles, atirando-lhos em direção à sua cabeça de seguida - Branca de neve. - ironizei mas parei quando vi o olho dele negro que ainda não tinha reparado antes - Chateaste-te com o Principe encantado? - devia ter andando metido em lutas estúpidas como fazia sempre em criança.

Cerrei o maxilar quando me empurrou e controlei-me para não me passar, acabando só por empurra-la também. Ela era só uma miúda, eu não batia em miúdas. - Vai chamar parvalhão ao teu noivo. - resmunguei desviando-me dos seus sapatados, conseguindo agarrar num. Olhei-o passando os dedos pelo salto e fiz pontaria à sua cabeça - Pelo menos sou bonita. - passei as mãos pelo meu cabelo e revirei os olhos com a sua pergunta - não, o cabelo loiro dele irrita-me, tal como o teu, cuidado ou ainda apareces careca. - atirei-lhe o sapato, fingindo que estava a apontar na sua direcção, mas ele caiu bem aos seus pés.

Revirei os olhos - Eu não tenho noivo por isso tenho de te chamar a ti. - olhei-o quando agarrou no sapato e começou a fazer-me pontaria à cabeça. Bem capaz disso era ele, já nada me admirava. Desde de criança que era gozada e mal tratada e ele tinha sido o pior deles todos. Tinha sido o Kenneth que me tinha feito passar os dias a chorar a não querer sair de casa e que mais tarde, quando o Keith tinha desaparecido por causa da Sophie, me tinha feito começar a cortar-me. Esfreguei o pulsos contra o meu vestido e baixei-me para agarrar no sapato - Ai de ti. - disse quando me ameaçou de ficar careta - Corto-te os tomates. - surpresa, já não era a menina que fazias chorar. Se bem que era o que me apetecia mas tinha crescido e aprendido. Sê cabra, não queres saber de nada.

-Então vai chamar ao teu irmão, ele também é - ri-me abanando a cabeça. Rapidamente a levantei quando ela me ameaçou cortar os tomates, sorrindo divertidamente - Uhh que a Zangada anda má - aproximei-me dela andando à sua volta e acabei por parar ao lado dela - não cresceste muito anã, tens que começar a olhar para cima que é para não ires contra as pessoas grandes - olhei-a meio de lado desviando depois o olhar para o jardim.

- Deixa o meu irmão. - disse irritada. O "meu noivo" tinha levado com uma frigideira na cabeça por falar mal do meu irmão depois do que se tinha passado com a Sophie. Revirei os olhos quando ele disse que eu não tinha crescido muito e me olhou de lado e estiquei o braço, dando-lhe um soco mesmo nas partes baixas - E as pessoas grandes que me irritarem, levam.

Revirei os olhos com o mesmo sorriso divestido de sempre quando me pediu para deixar o irmão dela - nem sequer o estou a agarrar anã - abanei a cabeça quando senti um murro nas partes baixas fechei os olhos com um gemido, agarrando-me àquela zona. Olhei-a já um bocado fora de mim e quando a dor abrandou agarrei-a pelos ombros, fazendo-a andar para trás até embater com as costas numa árvore - não. me. toques. nunca. mais - disse pausadamente enquanto olhava os seus olhos e afastei-me bruscamente, virando costas andando até ir buscar o outro sapato que ela tinha mandando mas que eu não tinha agarrado, mandando-lhe também para os pés.

- Não interessa, deixa-o em paz. - fechei os olhos quando as minhas costas bateram numa árvore e arquejei, sentindo-me sem ar por segundos. Desencostei-me devagar da árvore e agarrei no meu sapato que ele me atirou para os pés, calçando os dois - Porque não? - perguntei agora só a sentir um formigueiro nas costas - Tu é que és o rei que pode fazer tudo aos outros? Os outros têm de se deixar ficar? Não me parece. - e sim, eu estava a passar-me por forte quando estava cagadinha de medo que ele ainda me desse uma tareia.

Coloquei as mãos para cima fazendo uma careta - ele está em paz, calma lá irritadiça - resmunguei baixando as mãos. Fiquei de costas para ela, engolindo em seco enquanto suspirava baixinho. A sério que ela tinha dito aquilo sem conhecer nada de mim? Virei-me para ela com cara de poucos amigos e aproximei-me de novo - eu nunca te toquei na vida - olhei-lhe os olhos falando baixo com um indicador na sua direcção - por isso faz mais uma dessas e podes querer que eu te toco. E tu não vais gostar - abanei a cabeça.

Calcei-me enquanto ele estava de costas voltadas para mim e deixei-o falar. Desencostei-me completamente da árvore e aproximei-me dele. Ele tinha razão, tinha de levantar a cabeça para o olhar mesmo com os saltos - Não me metes medo, Kenneth. - sorri-lhe cinicamente - Já não sou uma criança. - continuei no mesmo sitio a olhar para ele e a tentar manter-me forte. Não podia ceder, não com ele. Só podia deixar de representar em casa, com o meu irmão, até com a Jess e com o Tommy, não noutro sitio onde estava constantemente em perigo de sofrer de novo. Preferia fazer os outros sofrer do que sofrer eu, tinha sido o que eu aprendi.

Semicerrei ligeiramente os olhos quando disse que não tinha medo de mim e abanei a cabeça - Porque é que dizes isso como se fosse um orgulho? - perguntei - eu não me alimento do teu medo - fiz uma careta afastando-me dela e abanei a cabeça rindo-me enquanto andava na direcção do meu apartamento, já estava a demorar de mais - mas olha que pareces. - pisquei-lhe o olho com um sorriso estúpido e meti as mãos nos bolsos.

Revirei os olhos e cerrei as minhas mãos em punhos enquanto me tentava controlar - Vai à merda. - gritei-o quando o vi a ir embora. Ajeitei a minha roupa e o meu cabelo e espreguicei-me para tentar estalar as costas que me doiam um bocado depois de ele me ter empurrado contra a árvore. Voltei a tirar a máquina da mala e tentei descontrair e fotografar de novo.

Sentei-me na zona do lago e continuei com a máquina na mão a tirar fotografias praticamente a tudo. Tinha saudades daquilo, já não o fazia à muito tempo. Carreguei no botão para ver as fotografias que tinha tirado e fiz uma careta quando apareceu uma do Kenneth que tinha tirado assim que estava a cair. Estava desfocada e torta mas ainda se conseguia vê-lo mais ao menos - Estúpido. - murmurei com um revirar de olhos. Era por causa de rapazes como ele, ou melhor, de pessoas como ele mas mais precisamente, por causa dele que eu tinha de continuar a passar a imagem de cabra. Tinha de me sentir segura e assim sentia-me muito segura mesmo.

Levantei-me da relva e deixei-me estar a passear no jardim. A minha vida tinha mudado tanto e tinha fugido para aqui por causa do meu irmão mas não só, precisava mesmo de sair da nossa casa para me afastar dos nossos pais e de todos, todos os outros como o Kenneth que me gozavam constantemente e me tinham levado a só fazer porcaria. Mordi o lábio inferior e desviei o olhar para o meu pulso onde haviam umas marcas dos cortes. Os cortes não tinham tido o objetivo de "exprimir a dor", o objetivo tinha sido mesmo tentar matar-me. Era uma criança farta de ser julgada, que o irmão que amava acima de tudo tinha deixado, tinha perdido tudo. Mas não tinha conseguido e tinha tido a necessidade de mudar, deixar de ser frágil. Obrigada Kenneth. Agora já não era mais aquela menininha frágil que se deixava afetar pelas palavras dos outros, já não.

Caminhei pelo jardim até encontrar um banco de madeira e sentei-me no mesmo, pousando a minha mala ao meu lado e tirei de lá a minha maquina fotográfica. Suspirei enquanto tentava afastar os meus pensamentos do Kenneth e comecei a tirar fotografias a uns pássaros que estavam pousados no passei do jardim - Pára de pensar nele. - resmunguei para mim própria com um suspiro.

Pousei a máquina quando me fartei de tirar fotografias e suspirei. O Kenneth continuava na minha cabeça e assim que a minha cabeça foi parar ao sofá, como tínhamos estado juntos, como ele me tinha tocado e tudo isso, senti um arrepio que sabia que era de tudo menos medo. Parecia uma adolescente maluca e necessitada. Era verdade que eu fazia-me a todos mas o Kenneth estava para lá dos todos, depois de tudo o que ele me tinha feito, era uma estúpida por estar assim por ele. Deixei cair a cabeça e suspirei.

Levantei-me do banco depois de arrumar a minha máquina na mala e ia voltar para casa do Kenneth para pedir desculpa e contar eu à Brianna mas depois lembrei-me que que o pai deles devia estar a chegar e não lhes queria arranjar mais problemas nem arranjar eu mais problemas. Suspirei e fiz uma careta. Também não queria ir para casa. O Keith e a Jess deviam estar lá e apesar de eu gostar bastante deles, não queria interromper enquanto eles estavam juntos por isso acabei por me voltar a sentar.

- Acho que vou dormir aqui. - disse com uma pequena careta mas acabei por me levantar, agarrar nas minhas coisas e comecei a caminhar até casa. Ia passar despercebida e subir até ao meu quarto para passar o resto do dia a dormir e tentar esquecer o Kenneth. Não valia a pena. Ia ajudar a Brianna se os testes dessem positivo mas mais nada..

Depois de ir ao ginásio e tomar banho lá, voltei a agarrar no meu saco de desporto e comecei a caminhar para casa. Estava a passar pelo jardim quando vi o Kenneth ao fundo e estava pronta a fingir que não o tinha visto e continuar a caminhar para casa mas semicerrei os olhos, havia ali alguma coisa que não estava bem. Comecei a caminhar em direção a ele e assim que parei, cruzei os braços no peito - Andas a vender coisas? - perguntei de olhos semicerrados. Ele podia negar mas eu sabia que sim. A Caroline já me tinha andando a dizer que uma "amiga" dela ia ao parque comprar cenas fixes a um loiro, agora fazia tudo sentido - O que é que tens para aí?

As pessoas começavam a conhecer-me finalmente, ter ido parar aos jornais por causa do assalto tinha dado os seus frutos. Quando vi uma coisa abaixo de mim, percebi que era uma rapariga e ia reclamar quando vi que era Summer, que nem sequer me disse mais nada a não ser perguntar se eu andava a vender. Cruzei os braços ao peito e olhei-o - Porque é que queres saber? -perguntei não me referindo à sua primeira pergunta, mas sim à segunda.

Levantei o olhar para ele, o que era ridículo, era horrível eu ser tão baixa mas como tinha ido para o ginásio, não tinha levado saltos altos. Revirei os olhos com a pergunta dele e pousei o saco de desporto no chão ao meu lado, continuando a olhar para o Kenneth fixamente - Porque quero saber o que andas para aí a vender. - respondi apenas - Uma amiga minha disse que o que vendes é bom por isso quero saber o que tens para aí para arranjar alguma coisa para mim. - disse com um encolher de ombros.

Revirei os olhos com a sua resposta e respirei fundo - eu não te vou vender nada - disse logo - e antes que perguntes porquê é porque já vi como é que tu ficas totalmente drogada e já se viu que o resultado não é bom - coloquei as mãos nos bolsos e apertei os sacos que tinha lá - não vais conseguir convencer-me - disse antes que ela falasse.

Semicerrei os olhos e abri a boca para falar mas não cheguei a dizer nada porque ele interrompeu-me. Juntei as sobrancelhas - Como.. - arregalei os olhos e dei-lhe um soco no braço - Na discoteca, drogaste-me a bebida! - dei-lhe outro soco - Estúpido, podia-me ter acontecido alguma coisa grave! - lembrei-me das mãos do outro nojento e senti um arrepio. Ele tinha-me salvo mas a culpa tinha sido dele também por isso era a obrigação dele - Quero alguma coisa. - disse cruzando os braços - Agora vais ajudar-me a drogar-me em vez de ser às escondidas. Ou é assim que preferes? - parecia que tínhamos voltado ao antes.

Soltei uma risada quando ela me deu um murro, percebendo o que tinha acontecido no outro dia na discoteca. - Tu és insuportável drogada - disse-lhe agarrando nos meus saquinhos e olhando-os discretamente tentando decidir o que lhe dar, era a coisa mais fraca que tinha, mas ainda era mais forte - não te vou dar, tens que me pagar. - disse, lá por ter ido para a cama com ela, não a ia beneficiar e este dinheiro era para mim mas principalmente para a minha irmã.

Revirei os olhos quando o Kenneth disse que não me ia dar nada, que tinha de pagar. Como se eu estivesse à espera que ele agora me desse prendas e me fosse fazer serenatas à janela por termos feito sexo, por amor de deus. Ele era um idiota, eu só tinha tido um momento de atração por ele, mais nada. Não tinha culpa de que apesar de ele na maioria das vezes ser um completo otário, fosse giro e até conseguisse ser querido. Baixei-me para o meu saco de ginástica e tirei de lá dentro a carteira. Abri a mesma que estava cheia de dinheiro, eu costumava guardar o dinheiro que os meus pais me davam em vez de o gastar logo e por isso é que tinha bastante ainda - Quanto?